Como o RH pode ser muito mais ágil?

Ser ágil já não é prerrogativa só da tecnologia. Os métodos ágeis estão, por exemplo, transformando o modo como as empresas contratam e administram seu pessoal e crescem.

Segundo Peter Cappelli, professor de administração da Wharton School e diretor do Centro de Recursos Humanos da instituição, em entrevista a Harvard Business Review, as mudanças no RH já eram esperadas havia muito tempo.

“Depois da Segunda Guerra, quando as manufaturas dominaram o cenário industrial, a burocracia era o problema: as organizações queriam que suas práticas de talento se baseassem em regras e fossem internamente consistentes, para poderem cumprir, com segurança, planos de cinco anos (e, às vezes, de 15 anos). Isso era razoável. Todos os outros aspectos das empresas, dos negócios centrais até as funções administrativas, estabeleciam metas, orçamentos e operações segundo a visão de longo prazo. O RH refletia e apoiava a forma como agiam”.

No momento, estamos observando uma transformação mais generalizada, porque a inovação rápida se tornou uma necessidade estratégica para a maioria das empresas, não apenas para algumas.

As empresas passaram a prestar atenção no Vale do Silício e nas empresas de software em particular, copiando suas práticas ágeis para gerenciar projetos.

Por isso, os modelos de planejamento estão sendo substituídos por métodos mais ágeis, orientados para o usuário, e mais adequados à adaptação no curto prazo, como prototipagem rápida, feedback iterativo, decisões baseadas na equipe e “sprints” centrados na tarefa.

Veja como o RH está sendo impactado com os métodos ágeis:

Avaliações de desempenho. Quando as empresas adotam métodos ágeis em suas operações centrais, resolveram ignorar a ideia de planejar com um ano ou mais de antecedência o andamento dos projetos e os prazos de conclusão.

Por isso, em muitos casos, a primeira prática de RH tradicional a mudar foi a avaliação anual de desempenho e as metas individuais.

Como as pessoas trabalhavam em projetos de prazo mais curto, com diferenças de amplitude, conduzidos por diferentes líderes e organizados em torno de equipes, a noção de que o feedback de desempenho deveria ser fornecido uma vez por ano, pelo chefe, era praticamente inconcebível.

Era preciso haver mais avaliações, mais frequentes e realizadas por mais pessoas.

Uma antiga pesquisa da CEB Inc. apontou que, na verdade, as pessoas passaram a receber menos feedback e apoio quando seus empregadores abandonaram as avaliações anuais. Isso porque muitas empresas não colocaram nada no lugar.

Os gestores não sentiram nenhuma necessidade urgente de adotar um novo modelo de feedback e desviaram sua atenção para outras prioridades. Mas abandonar as avaliações sem um plano para preencher o vazio foi, obviamente, uma receita para o fracasso.

Depois de aprenderem essa difícil lição, muitas organizações adotaram avaliações frequentes de desempenho, muitas vezes realizada projeto por projeto.

Essa mudança se espalhou para um grande número de indústrias. Em geral, o foco está em entregar feedback mais frequente ao longo do ano para que as equipes possam se tornar mais ágeis, bem como para corrigir os erros ao longo do percurso, melhorar o desempenho e aprender por meio de iteração — esses são princípios importantes da metodologia agile.

Coaching. As empresas que adotaram com mais eficácia as práticas de talento ágil investiram no aprimoramento das habilidades de coaching dos gestores.

A P&G  pretende tornar os gestores melhores coaches. Isso faz parte de um esforço maior para reestruturar o treinamento e o desenvolvimento de supervisores e melhorar suas funções na organização. A P&G investe tempo significativo no crescimento dos funcionários.

Mas transformar os supervisores em coaches de seus funcionários em vez de fazê-los permanecer juízes de atividades diárias foi um grande desafio para a cultura tradicionalista da P&G.

Por isso a empresa investiu pesadamente no treinamento de supervisores em alguns tópicos: como estabelecer prioridades e metas dos funcionários, como fornecer feedback sobre contribuições, e como alinhar as aspirações de carreira dos funcionários com as necessidades dos negócios e os planos de aprendizagem e desenvolvimento.

A ideia é que a promoção da capacitação dos funcionários e das relações com os supervisores aumenta o engajamento, e consequentemente ajuda a empresa a inovar e avançar mais rápido.

Embora ainda não tenha sido tomada uma decisão sobre a mudança cultural de toda a empresa, a P&G já relata melhorias nos tópicos apontados, em todos os níveis de gestão.

Equipes. O RH tradicional focava nas pessoas — suas metas, desempenho e necessidades. Mas agora que tantas empresas estão organizando seu trabalho projeto a projeto, seus gestores e sistemas de talento estão se tornando mais focados nas equipes.

Os grupos estão criando, executando e revisando suas metas e tarefas de acordo com a metodologia scrum — no nível de equipe, por enquanto, para adaptar-se rapidamente às novas informações à medida que vão chegando.

Os grupos também estão assumindo o encargo de acompanhar seu próprio progresso, identificar obstáculos, avaliar sua liderança e gerar insights para melhorar o desempenho.

Feedback multidirecional. O feedback de pares é essencial para correções de curso e desenvolvimento do funcionário em ambiente ágil, porque os membros das equipes sabem, cada um, melhor que ninguém, a contribuição que podem oferecer.

Nas organizações ágeis, o feedback “ascensional”, dos funcionários para os líderes de equipe e supervisores, é altamente valorizado. Como o feedback se espalha pelas equipes em todas as direções, muitas empresas utilizam tecnologia para administrar todo esse volume de informação.

Aplicativos permitem que os supervisores, colegas de trabalho e clientes ofereçam feedback imediato uns aos outros onde quer que estejam. Essencialmente, os supervisores podem baixar todos os comentários posteriormente, na hora de fazer as avaliações.

Alguns aplicativos permitem que os funcionários e supervisores pontuem os progressos das metas. Pelo menos um deles, o Slack, ajuda os gestores a analisar as conversas em plataformas de gestão de projetos para fornecer feedback sobre colaboração.

Dinâmica de equipes complexasA função do supervisor deixou de ser apenas administrar pessoas para assumir tarefas mais complexas de promover dinâmicas de equipe saudáveis e produtivas, é preciso muita ajuda nessa transição. A unidade especial de Inteligência de Equipe da Cisco fornece esse tipo de apoio.

Ela está encarregada de identificar as equipes de melhor desempenho da empresa, analisar como operam e auxiliar outras equipes a aprender a imitá-las. Ela utiliza uma plataforma chamada Team Space que abrange toda a corporação e monitora os dados dos projetos, necessidades e realizações das equipes para medir e melhorar suas atividades nas unidades e em toda a empresa.

Recrutamento As empresas também confiam mais na tecnologia para encontrar e rastrear candidatos que se adéquam melhor ao ambiente de trabalho ágil.

Nos EUA, a GE, IBM e Cisco estão trabalhando com o fornecedor Ascendify para criar um software que faça exatamente isso. A empresa de recrutamento de TI HackerRank oferece uma ferramenta online com a mesma finalidade.

Aprendizado e desenvolvimento. Tal qual o processo de contratação, o aprendizado e desenvolvimento precisa mudar para atrair com rapidez novas habilidades para as organizações. Muitas já dispõem de um conjunto de módulos de aprendizagem online que os funcionários podem acessar on demand.

Embora útil para as pessoas com necessidades claramente definidas, isso soa como dar ao aluno a chave da biblioteca e deixar que ele descubra sozinho o que precisa estudar para aprender.

Abordagens mais recentes utilizam análises de dados para identificar as habilidades exigidas para determinadas tarefas e progressos e depois sugerem aos funcionários individualmente o tipo mais adequado de treinamento e futuros serviços segundo suas experiências e interesses.

A IBM utiliza inteligência artificial para gerar esse aconselhamento partindo do perfil dos funcionários, que inclui cargos atuais e anteriores, trajetória de carreira esperada e programas de treinamento concluídos.

A empresa criou um treinamento especial para ambientes ágeis — usando, por exemplo, simulações animadas criadas em torno de uma série de “personas” para ilustrar comportamentos desejáveis, como fornecer críticas construtivas.

A Pepsi está dando um passo simples que foge desse modelo e reduz o prazo. Ela fornece breves atualizações trimestrais sobre o desenvolvimento de possíveis sucessores — ao contrário das atualizações anuais usuais — e retarda os encontros para que eles ocorram mais perto do momento em que provavelmente os sucessores assumirão seus postos.

Segundo Peter Cappelli, as atividades do RH também exigirão recapacitação. “O RH precisará de mais expertise em suporte de TI — principalmente considerando todos os dados de desempenho gerados pelos novos aplicativos — e um conhecimento mais profundo sobre equipes e supervisão direta. O RH não precisou mudar tanto nas últimas décadas como as linhas de operação que ele apoia. Mas agora a pressão aumentou, e a pressão vem do nível operacional, o que torna muito mais difícil para o RH se prender às velhas práticas de administração de talento”, finaliza.